Há dias uma cantora faleceu de forma trágica. A comoção foi nacional. Gente que nunca ouvira falar da pessoa entrou no clima comovente das narrativas midiáticas. E a audiência subiu. Pouco se falou dos outros três que faleceram tragicamente da mesma forma e com os mesmos sofrimentos. Quem alavancou a comoção foi apenas a cantora. Pobres coadjudantes desse drama real…
Hoje uma jornalista de longa data e de grande experiência política também se foi. Apenas os órgãos ligados ao seu último empregador e gente por ela entrevistada (políticos e gente pública) emitiu uma ou outra nota. Quantos que a assistiam diuturnamente, com sua simpatia e determinação, que a acolhiam em suas próprias casas souberam do fato e talvez tenham pensado: “Que chato. Bem, vida que segue…”
No topo das manchetes estão notícias que vendem. No meio dos sites informações que têm que ser entregues, sob pena de desmerecer o informativo. No final estão aquelas que preenchem espaços. Por fim as que não dizem absolutamente nada.
Há lágrimas demais para uns e olhos secos para outros. Os que comovem não são essencialmente os mais virtuosos ou que mais humanidade demonstraram, ainda que alguns o sejam. Os que levam às lágrimas são os que são produzidos pelos marqueteiros associados aos patrocinadores, que ganham com a morte alheia.
O amor está se esfriando de muitos, quiçá dos cristãos também.
Alguns receberam muito poucas lágrimas.
Os que morreram no exercício da medicina, tratando os enfermos pelo COVID 19, os técnicos de laboratório, os bombeiros, os trabalhadores em ambulâncias, os jornalistas expostos ao virus, poucas lágrimas receberam.
Os professores que adoeceram na pandemia, as babás e as cozinheiras escolares, hospitalares ou caseiras; os pastores e ministros religiosos que sucumbiram por terem pego a enfermidade durante visitas aos membros da igreja, em hospitais ou a celebrarem cerimônias fúnebres; os familiares que foram cuidadores de outros, os vizinhos que se apiedaram dos sofredores. Por estes quase nenhuma lágrima pública foi derramada.
Os bebês abortados em pleno vigor da sua gestação, por serem acusados de invasores da liberdade dos adultos, por não terem sido desejados, por serem tratados como acidentes nas diversões imorais desta geração, por estes apenas alguns ousaram chorar, pois na maioria dos casos foram tratados como segredo.
Quem chorou pelos idosos que passaram por necessidades nos asilos, enquanto a pandemia avançava a passos largos, que foram se tratar em convênios médicos sem escrúpulos, que receberam placebo em lugar de cuidados, que não tiveram a chance de se despedirem dos amigos e familiares? Quem chorou pelos cuidadores destas enfermarias geriátricas, pelas faxineiras que enfrentavam a contaminação, que se expunham por necessidade?
Os entregadores dos correios, dos aplicativos, dos mercados porta a porta, os transportadores, os caminhoneiros, os motoristas de ônibus, os guardas noturnos, os bilheteiros de passagens, os pilotos de aviões, os encanadores e eletricistas das companhias fornecedoras, os provedores de internet, os caixas de supermercado, os frentistas nos postos de combustível, os trabalhadores em depósitos de gás, os lixeiros, os pedreiros, os médicos, os dentistas, os terapeutas.
Quanta gente que morreu, que morre, que ainda morrerá, gente boa, gente decente, gente íntegra, gente lutadora, gente pobre ou não, gente que tinha sonhos, projetos, objetivos, mas que foi interceptada por uma bala perdida, por um assalto, por um acidente automobilístico ou aéreo, por um trem que descarrilou, por uma bicicleta atropelada, por um tombo letal.
Eu choro por cada um deles.
E pelos que merecem lágrimas, famosos ou não.
Não é o patrocinador ou a mídia, seja ela oficial ou financiada por grupos poderosos na internet que ditará a razão ou a frequência de minhas lágrimas.
Será a compaixão, o amor, o reconhecimento e o temor a Deus.
Sim. Por todos os que são dignos eu choro.
Pr. Wagner Antonio de Araújo
Colunista deste Portal