Tudo levava a crer que seria um dia normal como os demais. O grupo estava habituado a se encontrar, contar histórias, compartilhar seus desafios, ajudar viajantes que vinham de longe para prestar seus sacrifícios de adoração ou em busca de perdão para seus pecados e, de quebra, fazia dessa atividade o seu ganha pão.
Entretanto, alguém observava o comportamento de cada um e percebia que, apesar da aparente normalidade, havia algo de errado acontecendo ali. Havia o que se chamaria de desvio de finalidade.
O grupo não apenas agia de maneira automática, inconsequente até, com o coração focado tão somente em tirar dali o seu sustento, mas também ia além, explorando pessoas que vinham com seus corações abertos para Deus, impondo-lhes preços abusivos, explorando-os economicamente.
O circo estava montado e o espetáculo se repetia dia após dia.
Aquele, porém, que observava o comportamento dos integrantes do grupo, percebeu, repito, que havia algo errado. Ele não entendia como errada a atividade desenvolvida pelo grupo. Era legítimo o serviço prestado a viajantes que vinham de longe e, portanto, seria mais cômodo para eles adquirir um animal no local do sacrifício, em vez de trazer consigo de lugares muita vez distantes.
Era legitimo, também, que auferissem algum lucro nesta venda, como pagamento pelo trabalho que realizavam. O problema não era a venda ou o lucro em si, mas a exploração indevida dos semelhantes, o desvio da finalidade.
Eles haviam perdido de vista que faziam parte de um processo cujo objetivo seria aproximar pessoas de Deus e não um fim em si mesmo, muito menos um fim através do qual pessoas seriam exploradas em sua pobreza.
Diante disso, ele tomou uma decisão. Se conversou antes ou não com algum dos seus discípulos, não sabemos. O fato é que entrou no templo, derrubou as mesas dos cambistas e as cadeiras dos comerciantes, denunciando que a finalidade do que faziam havia sofrido desvio e que sua ação de virar mesas e derrubar cadeiras era ato simbólico, pedagógico, necessário ao restabelecimento do propósito inicial do local e do serviço que prestavam.
Foi um “deus nos acuda” e não demorou o início de discursos espirituais. – “Não está vendo que as crianças estão gritando “hosana ao filho de Davi”? Falavam com tanta indignação que quem os ouvia acreditaria que, de fato, a preocupação deles seria de natureza espiritual, o interesse seria pelo desenvolvimento do Reino de Deus.
Ele manteve o diálogo no nível teológico, mas sabia que teologia, para eles, era apenas fachada. O que visavam mesmo era garantir o status quo, era manter a ordem vigente do jeito que estava, pois nela seu prestígio, seus poderes, seu ganha pão estavam garantidos.
Ele retirou-se do lugar, deixou a cidade e foi para Betânia. Não foi uma saída normal. Ele sabia que suas ações teriam um preço. Mas seu coração continuava em paz, pois sabia a quem, efetivamente, deveria agradar e o preço que pagaria por isso.
Pr. Edvar Gimenes de Oliveira