Lições que a Igreja está experimentando durante a Pandemia

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1. Redescobrindo a verdadeira essência da Igreja

A primeira lição que igreja está experimentando durante esta pandemia é que estamos redescobrindo a verdadeira essência da igreja.

O afastamento social está nos possibilitando olhar a igreja de uma maneira diferente daquela que estávamos acostumados a ver. Se antes estávamos vivenciando uma vida cristã dentro das paredes do templo, focada apenas na satisfação de nossos desejos espirituais e voltada só para o atendimento de nossas necessidades emocionais, agora estamos percebendo o quanto estamos autocentrados ao redor do nosso umbigo. A seta que indica o caminho está voltada para dentro.

Distanciados fisicamente, percebemos que nossas comunidades têm se afastado da essência da Igreja, que é justamente ser luz para o mundo e sal para a terra. Estamos redescobrindo que não temos impactado a sociedade ao nosso redor, porque não estamos sendo obedientes ao nosso Senhor e ao seu mandado de que a medida que caminharmos devemos fazer discípulos de todas as nações. A seta que indica o caminho deve estar direcionada para fora.

As pessoas de nossas igrejas, em seu distanciamento comunitário, estão reparando nisso e estão sendo impelidas pelo Espírito a reavaliarem seu entendimento sobre a verdadeira essência da igreja e a redirecionarem suas energias para aqueles que não pertencem ao rebanho de Cristo.

2. Redescobrindo o essencial na vida da Igreja

A segunda lição que igreja está experimentando durante esta pandemia é que estamos redescobrindo o que de fato é o essencial na vida da Igreja.

Em janeiro tínhamos uma agenda bem elaborada para as atividades da igreja e um bom planejamento para os eventos. Só não contávamos com a pandemia. Ela desmontou nossas agendas e nosso planejamento estratégico foi por água abaixo. Aquilo que parecia ser essencial para a vida da igreja, os eventos e as programações, que quase sempre são voltadas para os próprios membros, deixou de existir instantaneamente. Sem essas atividades, estamos nos perguntando o que de fato é o essencial na vida da igreja.

Estamos descobrindo debaixo de nossas agendas alguns post-its com lembretes do Senhor de que a comunhão semanal da igreja tem, pelo menos, três propósitos principais: Primeiro, os cultos são para celebrar as maravilhas que Deus realiza semanalmente no meio do seu povo; Segundo, os encontros comunitários servem para estreitar os laços entre as pessoas que professam a mesma fé e fortalecer a todos que enfrentam as mesmas lutas diariamente; Terceiro, as reuniões da igreja devem ser a oportunidade de aprendizagem e treinamento para a missão de proclamar o Evangelho e fazer discípulos.

Quando penso nesses propósitos, lembro da transfiguração de Jesus. Pedro, Tiago e João estão com Jesus em um monte e logo a aparência de Jesus é transformada em um brilho só. Elias e Moisés se juntam a eles. Ali estavam em plena comunhão: Jesus, o Mestre; Moisés, o Legislador; Elias, o Profeta; e Pedro, Tiago e João, os Discípulos. Que encontro maravilhoso, diz Pedro! Dá até vontade de ficar ali para sempre. E é isso que Pedro sugere ao dizer ao Senhor: Se quiser, farei três tendas: uma será sua, uma de Moisés e outra de Elias. (Mateus 17.4). Imediatamente, a voz de Deus ressoa e diz: Este é meu Filho amado, que me dá grande alegria. Ouçam-no! (Mateus 17.5). Então, o brilho se desvanece e todos descem o monte transformados para a missão.

É tão bom e tão bacana que a irmandade desfrute a comunhão e celebre os grandes feitos do Senhor semanalmente e, então, saia dali intencionalmente para servir ao mundo com o Evangelho. Isso é o essencial na vida da igreja.

3. Redescobrindo o Pão do Céu além da Ceia

A terceira lição que igreja está experimentando durante esta pandemia é que estamos redescobrindo que o Pão do Céu vai muito além do pão da Ceia.

Estávamos acostumados a celebrar a Ceia do Senhor apenas entre nós cristãos e isso só era possível em nossas reuniões dominicais. Mas agora, ao nos achegarmos à Mesa do Senhor de forma online, quantos outros que não pertencem às nossas igrejas se achegam também?

A Comunhão dos Santos ganha um novo significado nas palavras anunciai a morte do Senhor até que ele venha, pois nos deparamos com pessoas famintas do Pão do Céu e a elas anunciamos o pão eterno como um oferecimento gracioso de Deus para todos.

Estamos redescobrindo que além do pão “espiritual” devemos oferecer o pão nosso de cada dia a todos os que dele necessitam. E isso está gerando uma maior fraternidade e solidariedade entre as pessoas, cristãs ou não, pois está manifestando a preocupação de cada cristão em estender suas mãos aos que também carecem do pão cotidiano. Este “serviço da mesa”, aquela diaconia restrita aos diáconos e diaconisas, agora está sendo praticado por muitos, que não são ordenados para esse serviço, mas que servem as mesas com amor e dedicação, repartindo o pão de casa em casa.

Enquanto você lê isso o Espírito não faz você lembrar das vezes que Jesus multiplicou os pães para que os discípulos alimentassem a multidão, que estava faminta por ter ficado até tarde ouvindo o Mestre ensinar e proclamar o Reino de Deus?

A celebração da Ceia é também um envio para um mundo carente de pão e de salvação e ambos se encontram em Jesus: a salvação pela sua morte e ressurreição, e o pão pela solidariedade, fraternidade e serviço diaconal de seus discípulos para com o mundo.

4. Redescobrindo a leitura e o ensino da Bíblia

A quarta lição que igreja está experimentando durante esta pandemia é que estamos redescobrindo que a leitura e o ensino da Bíblia é um exercício espiritual diário.

A Bíblia sempre foi o livro do povo de Deus. Acontece que muitos abriram mão do direito de ler e ensinar as Escrituras em favor de “especialistas”, que leem por eles e por muitos outros.

Em casa, como a família, a meditação bíblica voltou a ser uma prática familiar como há muito tempo não se via, imagino que desde o culto doméstico praticado no distante século 20. A retomada da leitura da Bíblia nos lares está dando a muitos uma autonomia de escolher os textos que mais atendem as suas necessidades, tornando possível responder perguntas que elas realmente estão fazendo e não aquelas perguntas que os pregadores imaginam que elas estejam fazendo.

O distanciamento social está ajudando o povo a se conectar diretamente com Deus através da sua Palavra. Isso é muito significativo, pois trará para as igrejas as verdadeiras questões do dia a dia, forçando a comunidade encontrar respostas para as demandas reais de pessoas reais.

5. Redescobrindo o Sacerdócio de todos os crentes

A quinta lição que igreja está experimentando durante esta pandemia é que estamos redescobrindo o Sacerdócio Universal de todos os crentes.

O Coronavírus tem forçado muitas pessoas a descobrirem os seus dons e a colocar esses dons em prática dentro de seus lares. Isolados fisicamente da igreja, mulheres e homens, que antes estavam acostumados a terceirizar as responsabilidades nos ministérios da comunidade, agora começam a redescobrir seus papéis na igreja.

Até antes da pandemia, entendíamos que o encargo de manter a igreja funcionando era somente daquelas pessoas eleitas ou nomeadas para cargos e funções. Agora, estamos tendo que ensinar os nossos filhos; estamos lendo a Bíblia; contribuindo; distribuindo os elementos da Ceia; orando; exercendo liderança; falando do amor de Deus para outros etc.

Você pode dizer que isso as pessoas já faziam. Está bem. Mas o que é diferente, é que elas estão redescobrindo que podem assumir esses compromissos por si mesmas, porque elas percebem que possuem talentos e dons espirituais e que estão sendo guiadas pelo poder do Espírito Santo. E isso é diferente, pelo menos para a maioria das igrejas focadas em uma hierarquia rígida com pouco espaço para o exercício do sacerdócio de todos os crentes.

6. Redescobrindo a Visão do Reino de Deus

A sexta lição que igreja está experimentando durante esta pandemia é que estamos redescobrindo a visão do Reino de Deus.

Antes da pandemia as igrejas estavam autocentradas. O Covid-19 “dispersou a Igreja” que, aos poucos, vai tomando consciência de que o Reino de Deus está entre nós e que ele é bem maior do que a própria igreja. Devagar e sem perceber a igreja vai se dando conta de que seu papel é bem mais modesto do que às vezes queremos atribuir a ela.

Essa retomada da visão do Reino de Deus está em curso não porque estamos refletindo a esse respeito, mas porque estamos pondo em prática os valores do Reino dos Céus, como diz Mateus, valores expressos especialmente no Sermão da Montanha. Esses valores incluem amar ao próximo e aos inimigos; promover a paz; exercer a misericórdia; praticar a esmola, a oração e o jejum, entre outros.

Você pode dizer que isso a igreja sempre fez. Certo, mas as pessoas sempre fizeram muito mais como igreja do que como cidadãos do Reino de Deus. Aliás, posso dizer que nas últimas gerações raramente tivemos tamanha oportunidade e necessidade de praticarmos os valores do Reino de Deus para além das paredes do templo. Parece que o distanciamento social tem aumentado a sensibilidade das pessoas. E o Espírito de Deus está canalizando essa sensibilidade para o serviço às nações como parte da expansão do Reino de Deus.

As lições que estamos experimentando como igreja durante esta pandemia estão apenas começando. Podemos afirmar que nunca mais seremos os mesmos, não porque não podemos mais ser os mesmos, mas porque não devemos mais ser os mesmos.

As redescobertas que estamos fazendo como povo de Deus são lições preciosas sobre pontos importantes da Igreja. Estamos nos perguntando sobre a própria essência da Igreja e isso é sobre seu propósito único, aquele propósito proposto por Jesus. Estamos nos questionando sobre o que de fato é essencial na vida da Igreja e isso é sobre as finalidades do culto e às funções das reuniões no templo. Estamos nos interrogando sobre a dimensão e extensão do sacramento da Ceia e isso é sobre o anúncio do pão espiritual e a partilha do pão material. Estamos nos indagando sobre a leitura e o ensino da Bíblia e isso é sobre a legitimidade e capacidade de todos para ler e ensinar as Escrituras. Estamos nos interpelando sobre o sacerdócio universal de todos os crentes e isso é sobre o exercício dos dons espirituais sob a direção do Espírito Santo. Estamos no inquirindo sobre a visão do Reino de Deus e isso é sobre a amplitude do agir de Deus no mundo.

A pandemia do novo Coronavírus criou uma atmosfera de preocupação, medo, dor, sofrimento, isolamento e distanciamento social. Tudo isso é muito grave e dolorido. Porém, o Covid-19 nos deu também o tempo necessário para repensarmos nossa forma de ser igreja e a oportunidade única de redescobrirmos nossa vocação como filhas e filhos de Deus.

Certamente que ainda é cedo para tirarmos conclusões definitivas sobre os efeitos da pandemia na vida da igreja. Mas as mudanças que estão em curso na comunidade de fé já estão nos transformando e continuará a nos transformar para muito além da crise do Coronavírus. A redescoberta do nosso propósito como igreja no mundo terá um efeito duradouro pelas gerações seguintes, se aprendermos essas e outras lições que Deus está nos fazendo experimentar no presente momento.

Assim, continuamos a orar para que o Senhor continue a nos transformar de forma poderosa.

Por José Roberto Cristofani

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