Uma declaração de amor no dia dos pais

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Foto: Reprodução.

Convido o leitor a imaginar o “Pai nosso” como sendo uma casa espaçosa e convidativa: casa e santuário de Deus. Entrar nessa casa é pisar em terreno sagrado, é como entrar “nos céus”, onde Deus está. É sentir o que Moisés sentiu ao se aproximar da sarça ardente. “Tira os sapatos de teus pés. O lugar em que pisas é terra santa. Tu vais falar com o Senhor do céu e da terra.”

Mas ao dizermos “Pai nosso, que estás nos céus”, e ao aproximarmo-nos do Deus todo-poderoso, também entramos num espaço amplo, num abrigo confortante e isento de medo, abrigo que irradia paz e que inspira confiança e segurança: o Senhor do céu e da terra vai encontrar-se conosco e vai revelar-se como nosso Pai. Nosso “Aba”, um Pai amoroso, que deseja falar conosco, que deseja compartilhar conosco os seus planos, fazer-nos sentir o seu paterno amor. E chamando-o de “Aba, Pai” nós mesmos lhe fazemos uma declaração de amor.

Onde fica Jesus Cristo no “Pai nosso”?

Muitos já perguntaram: onde é que fica Jesus Cristo, no “Pai nosso”? É verdade, foi ele quem nos ensinou a Oração Dominical. Mas na própria oração o seu nome não aparece, e poderia parecer que o Filho de Deus está sobrando, quando falamos com nosso Pai celeste. Em resposta gostaria de dizer algo que eu mesmo demorei a descobrir, mas que é capaz de iluminar todo o espaço da casa na qual entramos, e de encher-nos de imensa alegria: nós não entramos na casa de Deus como estranhos, nem entramos sozinhos. Quem vai ao nosso lado é Jesus Cristo, o Filho de Deus, aquele que tem o direito filial de habitar na casa paterna.

Este fato glorioso já é revelado pelas primeiras duas palavras da Oração Dominical: “Pai nosso”. Este “nosso” indica, primeiro, que não oramos a oração de Jesus sozinhos, como indivíduos isolados. Indica que somos elos duma corrente de incontáveis filhos e filhas de Deus que oraram a oração de Jesus através dos séculos, por todos os cantos da terra, a começar com os próprios discípulos de Jesus. Liga-nos com nosso vizinho doente, com os irmãos na comunidade, mesmo com irmãos e irmãs difíceis, liga-nos até com os que vivem além dos muros de nossa igreja. Como é que vamos excluir de nossa comunhão pessoas pelas quais Deus aceita ser chamado de “Pai nosso”? Assim nos conscientizamos que a oração de Jesus nos livra de nossa solidão e nos posiciona e define como membros do corpo de Cristo.

Mas o “nosso”, no meu entender, antes de tudo deixa claro que Jesus se identifica conosco, entrando na casa do Pai a nosso lado, e com isso nos certifica de que o seu Pai é também o nosso Pai. Sem Jesus não haveria “Pai nosso”. Ele é a porta da Oração Dominical. Sem ele, o santuário permaneceria trancado. E veremos mais tarde que Jesus também está presente em cada uma das preces de sua oração.

É verdade, nos Evangelhos Jesus sempre distingue entre “vosso Pai” e “meu Pai”, já que ele, como Filho, tem um relacionamento eterno com Deus, de cuja divindade participa. Jesus Cristo, que, por direito filial, habitou na casa do Pai pela eternidade, veio para fora da casa e se identificou conosco, que vivíamos longe de Deus. O Pai lhe falou, no dia em que foi batizado nas águas do Jordão: “Tu és meu filho amado em quem me comprazo”.

Mas logo o Filho amado de Deus entrou na fila dos pecadores, identificado com eles, deixando-se batizar com eles. No fim de sua caminhada terrena, chegou a entregar sua vida na cruz por amor aos pecadores perdidos. E agora ele leva os filhos pródigos de volta para a casa paterna e lhes abre caminho para o coração do Pai. “Pai, quero que os que me deste estejam comigo onde eu estou” (João 17.24). “Naquele dia compreenderão que estou em meu Pai, vocês em mim, e eu em vocês” (João 14.20). É como se, no início da Oração Dominical, Jesus dissesse: “Aba, Pai, sou eu que estou chegando. E comigo vêm os que tu me deste”. E, dirigindo-se para nós: “Vede, este é o meu Pai e o vosso Pai. Falai-lhe sem medo, já que ele vos ama como se fosse eu, o seu Filho amado”.

O “Pai meu” de Jesus

A este ponto de nossa reflexão sobre a Oração Dominical, recomendamos aos nossos leitores que abram o capítulo 17 do Evangelho de João, já citado acima, e que se inteirem de seu conteúdo. Aqui encontramos a assim chamada Oração Sacerdotal de Jesus. Consideramos este capítulo (o “Pai meu” de Jesus) uma leitura complementar indispensável para a compreensão do “Pai nosso”. Neste capítulo Jesus nos faz vislumbrar a profundidade de seu próprio relacionamento com o Pai. E, ao ler o que ele orou, sentimos que ele nos quer atrair para um relacionamento semelhante com nosso Pai, uma comunhão que não tem limites, um amor alimentado por fontes eternas. No decorrer das próximas páginas vamos recorrer várias vezes a este capítulo, que nos permite olharmos para dentro do coração de Jesus.

E nunca nos esqueçamos: o Pai de Jesus é também o nosso Pai! Por isso nosso Senhor não nos ensinou a orar “Pai de Jesus, que estás nos céus”, mas “Pai nosso, que estás nos céus”. Este “nosso” é nossa esperança, pois através dele seguramos firmemente a mão de Jesus, e Jesus segura a nossa mão. Ao lado e em nome daquele do qual o Pai disse: “Este é meu Filho amado em quem me comprazo”, poderemos entrar confiadamente no santuário, sabendo que o Pai de Jesus igualmente se compraz naqueles que pelo Filho eterno foram feitos filhos e filhas de seu amor.

Os céus em que o Pai habita

“Pai nosso que estás nos céus”. Na visão dos antigos, havia sete céus, um mais alto que o outro, habitados por Deus e por seus anjos. Para nós, criaturas da era espacial, fica difícil imaginar um espaço “além do espaço”, onde possamos imaginar que Deus habite. Céus, para nós, sugerem vastidão, vazio, estrelas, planetas, galáxias, quasares, raios cósmicos. Sugerem distância. Como é que devemos imaginar o céu da fé?

Antes de tudo, não imaginemos o céu da fé como lugar, menos ainda como lugar distante. O céu em que cremos não é lugar, ocupado por seres ou coisas que ocupam espaço. É antes uma dimensão acima e fora do tempo e do espaço, uma realidade acima de toda realidade material. Uma dimensão e uma realidade que, no entanto, chegam a tocar e a penetrar a nossa vida terrena. Assim, quando falamos em céu, ou céus, não pensemos em distância, mas pensemos antes em poder, em majestade, em santidade, em glória, em justiça, em amor sem limites. Céu pode ser uma realidade mais próxima de nós do que nossa própria veia jugular, mais íntima que o palpitar de nosso próprio coração.

E eu não consigo imaginar um céu sem Jesus. Foi ele quem nos abriu o céu. No dia de seu batismo os circunstantes viram o céu aberto, e viram o Espírito Santo descer sobre ele assim como desce uma pomba. Por essa abertura nós também temos acesso ao céu de nosso Pai, ao palácio do Rei, do Deus todo-poderoso. Li recentemente os seguintes dizeres no vidro de um automóvel: “Não sou o dono do mundo, mas sou filho dele”. É verdade. Os que somos de Cristo, os que fomos batizados em seu nome e que entregamos nossa vida a ele, somos filhos e filhas de Pai rico. Somos criaturas com carteira de identidade celeste. Não somos nenhum João-Ninguém, nenhuma Fulana-Sem-Nome. O céu é nossa herança em Jesus Cristo.

Nota: Artigo originalmente publicado no livro Pai Nosso: refúgio e escola de oração, da Editora Encontro.

Por Lindolfo Weingärtner

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