Tribunal da internet: Quem julga e condena precipitadamente contribui para a morte

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Nego do Borel Foto: Reprodução.

Não há dúvida de que o surgimento das redes sociais trouxe muitos benefícios, como a facilidade de comunicação, informação e entretenimento. Mas o mundo virtual também é algo que, como outras coisas, se for usado de forma errada, pode trazer vários prejuízos, e um deles é o chamado “tribunal da internet”, uma realidade triste e perigosa que pode contribuir até para a morte.

No momento em que escrevo este texto, o cantor Nego do Borel está desaparecido, conforme relatou a mãe do artista, que fez o registro do desaparecimento dele na segunda-feira (4), na 42ª DP (Recreio), após tentar impedir, sem sucesso, que o filho saísse da sua casa. O episódio ocorreu poucos dias após ele ter sido expulso do reality A Fazenda 13.

Segundo a produção do programa, a expulsão de Borel ocorreu porque ele passou a ser suspeito de ter cometido “estupro de vulnerável”, após ter se deitado com a modelo Dayane Mello à noite, enquanto ela estaria embriagada, de acordo com relatos dos participantes do programa. A assessoria do cantor afirmou, no mesmo dia da sua saída, que ele iria “provar mais uma vez toda a sua inocência”.

Prudência, discernimento e um alerta

Meu objetivo no texto desta semana não é tratar das suspeitas envolvendo Nego do Borel. O que é de competência judicial deverá ser tratado no âmbito judicial. A minha competência, por outro lado, é a psicológica, e é aqui onde entra a preocupação com o chamado “tribunal da internet”, sobre o qual quero fazer algumas observações gerais.

A primeira delas é justamente sobre o maior perigo desse tipo de tribunal, que é o julgamento precipitado acerca dos fatos. Muitos internautas não fazem diferença entre acusação, suspeita e condenação e, por isso, já saem condenando indivíduos pela suposta prática de crimes, mesmo sem a existência de qualquer condenação legal, devidamente transitada e julgada.

Muitas vezes o acusado nem tem a chance de se defender, pois, ao acessar suas mídias sociais, já se vê “cancelado” pelo público.

Quero deixar claro, mais uma vez, que não estou defendendo “A” ou “B” nem fazendo acusações a favor ou contra o caso mencionado anteriormente. São observações gerais sobre um problema real e preocupante, que deve ser trazido à tona como um alerta para a sociedade.

A forma correta de reagirmos a situações do tipo é tratando cada caso de acordo com a fase de apuração em que está. Se é denúncia, como denúncia; se suspeita, como suspeita; se como condenação, como condenação. Jamais da forma como não é, pois, assim, corremos o risco de acusar e condenar pessoas por crimes que não cometeram, trazendo sobre elas prejuízos até irreparáveis de ordem emocional, financeira, familiar etc.

Em alguns casos, esse tipo de condenação prévia é muito grave, pois não se tratam de acusações simplórias, como a de quem deixou de pagar uma dívida de R$ 100,00, por exemplo, mas de coisas gravíssimas, como a prática de estupro. Quem sofre essa acusação, se realmente praticou o crime, deve ser julgado e devidamente condenado.

Mas e se a acusação não prosperar? Se a suspeita não vier a ser confirmada por via judicial e o acusado for declarado inocente, como fica a reputação e o psicológico dessa pessoa, após ter sido massacrada publicamente e condenada previamente no “tribunal da internet”?

Já tivemos na imprensa casos reais de pessoas que foram agredidas, literalmente espancadas e mortas após falsas acusações circularem na internet. Pessoas inocentes, portanto, foram vítimas do julgamento precipitado e equivocado de cidadãos comuns que se deixaram influenciar por esse tipo de “tribunal”.

Essa é a nossa grande preocupação, e é isso o que devemos evitar, pois quem julga e condena possíveis inocentes pode estar contribuindo para a sua morte, sim, por via emocional, através da depressão, da destruição familiar, pelas sequelas financeiras, pela ruína profissional e por tantos outros efeitos destrutivos que uma injustiça de grande repercussão pode acarretar.

Por fim, também faço esse alerta porque eu mesma já fui vítima disso. Por anos, tive que enfrentar processos judiciais movidos por grupos e ativistas LGBTs que me acusavam de praticar a “cura gay”. Até hoje recebo vídeos e áudios de alunos em salas de aula, nos cursos de psicologia, mostrando professores irresponsáveis me acusando de fazer algo que nunca fiz. Felizmente, saí vitoriosa em todos os casos!

Portanto, diante de quaisquer acusações e suspeitas, que possamos discernir melhor as coisas sem fazer julgamentos prévios. Isso não é importante apenas para preservar potenciais inocentes, mas também para fazer valer a culpa e a condenação dos verdadeiros culpados pelos crimes que cometeram.

Fonte: Pleno NewsMarisa Lobo – Possui graduação em Psicologia, é pós-graduada em Filosofia de Direitos Humanos e em Saúde Mental e tem habilitação para Magistério Superior.

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