Vindo, pois, Davi para sua casa, em Jerusalém, tomou o rei as dez mulheres, suas concubinas, que deixara para guardarem a casa, e as pôs numa casa sob guarda, e as sustentava; porém não as possuiu; e estiveram encerradas até ao dia da sua morte, vivendo como viúvas. (2 Sm 20:3)
Eu não tenho pecadores de estimação, uma vez que pecado é pecado na vida de qualquer pessoa, inclusive na minha. Por isso me rendi a Cristo, pois sou um pecador. Mas, por Cristo, fui perdoado e transformado em nova criatura. Aleluia!
Dez concubinas. Quem eram essas mulheres na vida de Davi, o “homem segundo o coração de Deus”?
Eram suas amantes. Aliás, eu confesso que só aceito os textos por ele escritos porque tenho sólida, firme e inabalável convicção de que foram “INSPIRADOS” por Deus. Deus falou através de sua autoria. Mas dele, do homem, de sua moral e do sangue que molhava as suas mãos, não aceitaria. Festejamo-lo como “um certo pastorzinho”, como o “herói que matou Golias”, mas nos omitimos quanto aos seus gravíssimos erros, inclusive o de perseguir os filhos de Zeruia, chefes de seu exército e guarda, entregando o posto ao combatente Amasa, chefe da milícia chefiada pelo falecido filho Absalão.
Eram dez amantes de Davi. Dez das muitas que já tivera. Essas mulheres ficaram a tomar conta do palácio quando fugira de seu filho Absalão, usurpador do reino. Este, ao sentar-se no trono do pai, e para fazer-se execrável ao progenitor, abusou publicamente de tais mulheres, cometendo adultério grotesco e imundo. Depois, quando o pai recuperou o reinado e Absalão foi morto, reencontrou as mulheres e, como prêmio por terem ficado no palácio e terem sido agredidas transformou-as em prisioneiras até o resto de suas vidas.
Delas não sabemos o nome. Não sabemos qual a idade que tinham, se possuiam ou não filhos, se tinham ou não algum bem, se sofriam de alguma enfermidade, se eram tristes, revoltadas ou depressivas. Só sabemos que foram objeto nas mãos daquele que as possuiu à força, que transformou-as em escravas e que as puniu sem que fossem culpadas.
Ah, mulheres sem nome! Não se sabe quanto tempo viveram, se duraram muito, se algum dia puderam ver o sol mais claro ou a noite mais suave. Só sabemos que eram dez e que foram colocadas em custódia até que morressem.
Cada vez que leio isso me revolto contra os pecados de gente que esqueceu-se dos valores divinos! A Bíblia torna-se a cada dia mais verdadeira, pois, diferentemente dos livros religiosos falsos, ela não esconde o erro de suas personagens. Davi foi um homem cujo coração dobrou-se ao âmago da vontade de Deus, mas com absoluta certeza também foi um ímpio. Se não fosse a graça de Deus a operar em seu coração não haveria outro lugar senão o inferno para alguém que teve misericórdia seletiva, muito complacente com uns e mortal para com outros.
Seria lícita a bigamia, a poligamia, o concubinato naqueles dias? Era do agrado de Deus? Deixemos o Senhor Jesus Cristo responder: Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem. (Mt 19:6). Para Cristo, o LOGOS de Deus (a própria Palavra revelada) não existia a possibilidade de três, quatro ou mais relacionamentos conjugais, mas um só. O que disto passasse era pecado, desvio da criação divina. Nas leis mosaicas havia o estabelecimento de regras sociais para essas anomalias, o que JAMAIS fora expressão da vontade diretiva de Deus. Ao receber as tábuas da Lei Moisés leu: Não adulterarás. (Ex 20:14). Adultério é a violação do compromisso e da fidelidade para com o cônjuge. Um cônjuge só. Por serem os homens detentores do poder, inclusive familiares, só restava às mulheres aceitar passivamente a imposição deles a realidade de seu futuro: ou esposas, ou concubinas ou o que tivesse. Triste vida destas senhoras!
Voltemos a essas pobres mulheres de Davi. Quem chorou por essas concubinas? Quem delas se lembra hoje para não deixar a sua memória perecer? Que sonhos ou desejos elas puderam realizar em suas vidas? Quem puniu o estupro de Absalão às suas míseras existências? Ninguém. Passaram pela vida apenas como objetos e seres em sofrimento.
Quantas mulheres assim existem hoje! Mulheres que apanham dos maridos, mulheres abandonadas com suas proles e necessidades, mulheres traídas bestialmente e expostas à vergonha e ao perigo! Mulheres que choram baixinho no cuidado para com os filhos enquanto são severamente agredidas por seus cônjuges, mulheres que deixam de comer para dar aos pequeninos o seu pão. Pior que isso são as que são privadas dos próprios filhos, roubadas, arrancadas do convívio de seus próprios rebentos! Mulheres que choram, lágrimas que caem quentes no chão frio, corações entristecidos.
Graças a Deus que não há santos que possam reinvindicar méritos diante de Deus. Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus; (Rm 3:23). Davi foi um pecador como qualquer outro homem, indigno da graça de Deus. Não só ele, mas seu filho Salomão, cuja moral foi imensamente pior do que a do seu pai. Porém, e bendito seja Deus, Jesus Cristo foi maior do que eles! E eis aqui está quem é maior do que Salomão. (Lc 11:31). Para Cristo, o Filho do Deus vivo, que nunca teve pecado e jamais desilude a quem O segue, a conversão, o arrependimento e a fé nEle é condicional para que se alcance a graça de Deus:
Se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis. (Lc 13:3)
Se ninguém chorou por elas, pelas concubinas de Davi, que a misericórdia divina possa alcançar as mulheres de hoje que choram por serem vítimas das violências do mundo. Que as lágrimas de mulheres sem nome não sejam anônimas diante do trono do Senhor. Não lágrimas de remorso por serem pecadoras e terem feito as piores escolhas, pois colhem do fruto que plantaram; mas aquelas que, oprimidas e conduzidas à força a comportamentos e situações que não pediram, choram de dor e de tristeza, de impotência e de solidão.
Que Cristo venha e, com Ele, o consolo!
Aniquilará a morte para sempre, e assim enxugará o Senhor Deus as lágrimas de todos os rostos, e tirará o opróbrio do seu povo de toda a terra; porque o Senhor o disse. (Is 25:8). E Deus limpará de seus olhos toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas. (Ap 21:4)
O verdadeiro cristianismo tem que tratar as mulheres com dignidade. Se assim não fizer, não é cristianismo.
Pr. Wagner Antonio de Araújo
Colaborador deste Portal