INTRODUÇÃO
“Ai dos que ao mal chamam bem e ao bem, mal! Que fazem da escuridade luz, e da luz, escuridade, e fazem do amargo doce, e do doce, amargo!” (Is 5.20)
O relativismo é uma teoria que nega a existência de verdades absolutas. Segundo seus defensores não há nada que valha para toda a humanidade. Não existe ponto final, apenas reticências. Tudo (leis, valores, crenças) depende do ponto de vista do observador. É claro que essa ideia está na contramão do ensino bíblico. Afinal, as Escrituras, repetidas vezes, apontam verdades absolutas (Gn 1.1; Sl 24.1; Jo 8.32; 14.6). Isso torna o relativismo ainda mais danoso. Porque, uma vez abraçado, requer a negação da Palavra de Deus. Não há como ser cristão e relativista ao mesmo tempo. São posturas autoexcludentes.
Mesmo assim, existem indivíduos que, professando a fé cristã, insistem em relativizar conceitos e ensinos bíblicos. O mais alarmante é que muitos deles ocupam posições de liderança. E, com suas ideias, acabam arrastando multidões para o caminho do erro. Por conseguinte, para não ser aliciado, é imprescindível conhecer os detalhes dessa teoria, bem como sua refutação.
1 – ORIGEM DO RELATIVISMO
“O homem é a medida de todas as coisas”. Com essa frase, o filósofo grego Protágoras (480-411 a.C.), considerado o pai do relativismo, negou abertamente a existência de critérios absolutos para distinguir o verdadeiro do falso. Para ele, o único critério válido para essa distinção era o próprio homem. De modo que não há certo e errado. Tudo depende da percepção do indivíduo.
Com o passar do tempo, outros filósofos desenvolveram esse raciocínio até torná-lo absoluto. Nietzsche (1844-1900), por exemplo, a partir de uma reflexão relativista, concluiu que os valores humanos são, na verdade, construções históricas, e não parte de uma ética universal. Isto é, para Nietzsche, o certo e o errado dependem do momento histórico em que se vive.
Todavia, o relativismo é muito mais antigo que a filosofia propriamente dita. No relato da queda do homem, vemos o primeiro momento em que a verdade foi relativizada. Senão vejamos, em Gn 2.17, Deus ordenou a Adão que não comesse do fruto da árvore da ciência do bem e do mal, deixando bem claro qual seria o resultado da desobediência: a morte. Contudo, o diabo relativizou a fala divina, insinuando que era uma verdade produzida para impedir o primeiro casal de se tornar igual a Ele. Ou seja, era “a verdade de Deus”, e não uma verdade absoluta e universal. Por essa razão, não precisava ser observada. Não haveria prejuízo em proceder de outra maneira. Assim, seguindo a orientação satânica, eles transgrediram o mandado divino, e a relativização, por causa da queda, foi cada vez mais propagada.
2 – PRESSUPOSTOS DO RELATIVISMO
a) A verdade depende do indivíduo
O relativismo, embora tenha de, necessariamente, negar a existência de um Deus único e soberano, acaba, inevitavelmente, atribuindo soberania ao indivíduo. De sorte que este é colocado num patamar superior ao do Todo-poderoso. Isso porque, na ótica relativista, a existência de Deus depende de quem crê n’Ele, não sendo, portanto, uma verdade absoluta. Entretanto, segundo a Bíblia, essa é o pensamento dos néscios (Sl 53.1). O cristão, ao contrário, crê que Ele existe (Hb 11.6).
Mas, se a verdade realmente dependesse de cada um, os atos de quem quer que seja não poderiam servir de padrão para a conduta dos outros. Ou seja, todo tipo de comportamento deveria ser aceito: roubo, adultério, estupro, pedofilia, etc. Não haveria parâmetros! Pois bem, é desse jeito que um relativista pensa. Por isso, para eles, o único critério é a autossatisfação. Se me sinto bem faço, se não, não faço. Isso lembra o ambiente caótico descrito no livro de juízes: “Naqueles dias, não havia rei em Israel; cada qual fazia o que parecia direito aos seus olhos” (Jz 17.6).
É triste constatar isso, mas essa lógica hedonista está presente nas igrejas contemporâneas. O fator determinante para filiação a uma igreja local ou para reconhecimento do “sucesso” ministerial é a satisfação do indivíduo. De maneira que a expressão, “o cliente sempre tem razão”, outrora restrita ao âmbito comercial, se aplica perfeitamente ao atual contexto evangélico.
Não há como concordar com esse tipo raciocínio. Afinal de contas, a Bíblia ensina que o propósito do crente é glorificar a Deus em tudo o que faz (Mt 5.16; 1Co 10.31; Ef 1.3-6), e não a satisfação pessoal. Outrossim, as Escrituras apresentam um padrão único e universal para a conduta humana: a Palavra de Deus (2Tm 3.16-17). Portanto, na observância desse padrão, um indivíduo pode ser modelo para os demais (1Tm 4.12). Além do mais, por mais que alguém se recuse a viver de acordo com os preceitos bíblicos, eles permanecem absolutos. Até porque, no fim, eles serão o parâmetro para o julgamento (Jo 12.48).
b) A verdade depende do momento histórico
Conforme este pressuposto, a verdade muda com o passar do tempo. Para justificá-lo, é comum citar fatos relacionados ao desenvolvimento científico. Um exemplo disso é a passagem do geocentrismo para o heliocentrismo. Porquanto, até o início do século XVI acreditava-se que a Terra era o centro do universo. Hoje, no entanto, como resultado dos estudos de Nicolau Copérnico (1473-1543), sabemos que essa conclusão está equivocada.
Mas, o que, de fato, mudou? A verdade ou a concepção da verdade? Será que a Terra cedeu o lugar central para o sol, ou o homem descobriu que as coisas sempre foram assim? Com certeza, a última opção é a verdadeira. A verdade não muda com o tempo. O que é verdade continua sendo verdade. O que muda é a interpretação da verdade. Um exemplo disso é a Palavra do Senhor. Ela é a verdade (Jo 17.17) e permanece para sempre (1Pe 1.24,25). Tudo que está registrado nela se cumprirá (Mt 5.18). Evidentemente, se tudo se cumprirá nada mudará. Porém, ao longo do tempo, houve e continuará havendo interpretações equivocadas. Isso não altera ou põe em descrédito a revelação do Senhor. Na realidade, isso já estava previsto (2Pe 2.1-4).
Sabe-se, entretanto, que muitos desses erros interpretativos serviram para justificar atrocidades, tais como escravidão, ditaduras e genocídios. Por conta disso, alguns líderes religiosos argumentam que, já que a Bíblia foi usada para defender causas desumanas, devemos relativizar a verdade bíblica para alcançar fins nobres, relacionados ao tempo presente. Em outras palavras, a ideia é adaptar a mensagem das Escrituras ao discurso dos movimentos sociais contemporâneos, tornando-a mais branda e menos intransigente.
Isso é uma grande heresia! Não podemos pregar outro evangelho (Gl 1.8)! A mensagem bíblica deve ser anunciada tal como foi registrada (Ap 22.18.19). O fato de que a Bíblia foi usada para legitimar atrocidades não significa que ela possui uma mensagem indecifrável, e nem constitui uma autorização para relativizar seu conteúdo. Na verdade, isso demonstra o perigo de uma interpretação equivocada (2Pe 3.15,16).
c) A verdade depende da cultura
Para os relativistas, uma vez que cada sociedade ou cultura possui códigos morais distintos, nenhum deles pode ser aplicado a todos os homens. A verdade, por conseguinte, varia conforme a cultura. Para fundamentar esse raciocínio, normalmente, seus defensores mencionam as práticas atrozes de comunidades tribais, tais como a circuncisão feminina, o infanticídio indígena e o canibalismo, destacando-as como exemplo de ações limitadas a um ambiente cultural. A partir daí, concluem que a noção de certo e errado é sempre determinada pelo código moral da sociedade. Após isso, dão um passo ainda mais ousado: condenam o julgamento de condutas não cristãs, argumentando que nosso modelo ético (a Bíblia) é apenas um dentre muitos, e, portanto, não pode ser considerado absoluto. Por isso, temos de ser mais tolerantes e inclusivos.
É óbvio que as Escrituras rechaçam essa conclusão. Afinal, o pressuposto bíblico fundamental é que Deus é a fonte da verdade, e não o homem. Haja vista, que Ele revelou a verdade acerca de si por meio da criação (Sl 19; Rm 1.18-20) e da Bíblia (1Co 2.9,10; Gl 1.11,12; Jo 17.17). De maneira que, se algo a respeito da criação é verdadeiro, o é porque o Senhor fez assim. Até mesmo a verdade histórica é resultado da ação de Deus (Gn 45.7,8; Dn 5.21; Mt 10.29; Rm 8.28). Logo, não é a cultura que determina o que é verdade, mas sim o Todo-poderoso.
3 – CONSEQUÊNCIAS DO RELATIVISMO
a) O politicamente correto
Já que, de acordo com o relativismo, cada um tem sua própria verdade, defender convicções se torna algo ofensivo, um “discurso de ódio” como dizem alguns. O pior de tudo é que há pastores afirmando isso. Porém, a Bíblia nunca proibiu os crentes de terem convicções. Na realidade, segundo as Escrituras, ter convicção é algo valoroso (1Ts 1.5).
Mesmo assim, quem segue essa linha é capaz de coibir a evangelização sob a justificativa da tolerância e do respeito às outras religiões. Porque, na concepção deles, evangelizar seria o mesmo que dizer que a religião do outro está errada; e não podemos fazer isso. Evidentemente, a Bíblia contraria esse pensamento. Inclusive, em várias ocasiões, aponta outras práticas e compreensões religiosas como erradas (1Co 10.20; 2Pe 2.1). Além disso, proclamar o evangelho é uma ordem de Jesus (Mc 16.15). Desprezá-la é o mesmo que desobedecê-lo.
b) O pragmatismo
Como no relativismo a verdade é variável, o parâmetro para distinção entre o que é verdadeiro e o que é falso é a funcionalidade. Sendo assim, só é certo e verdadeiro aquilo que funciona. O que não funciona é falso. Essa maneira de pensar é conhecida como pragmatismo.
O problema dessa compreensão é que o evangelho nem sempre produz uma resposta positiva (At 7.57-60; 17.32-34; 1Co 1.22,23). As mentiras satânicas, por outro lado, muitas vezes, são eficazes (Mt 24.23,24; 2Co 4.3,4). Isto é, a satisfação humana, definitivamente, não é um parâmetro seguro (Mt 7.13,14; 15.19).
CONCLUSÃO
O relativismo é mais uma estratégia de Satanás para frear o avanço da igreja, desestabilizando-a por meio de um ataque direto ao seu alicerce: a verdade. Embora muitos sejam enganados por esse discurso, não há como servir a Cristo e abraçar seus pressupostos. Se o fizermos, estaremos negando o Salvador, o qual destacou muitas verdades absolutas (Jo 3.36; 10.30; 14.6). Portanto, é preciso reafirmar as verdades bíblicas e confrontar esse ensino infernal conhecido como relativismo.
Pr. Cremilson Meirelles