No dia 09 de setembro de 2022, em um evento do Partido dos Trabalhadores, um pastor batista, que ocupa um cargo de liderança denominacional, declarou que a igreja evangélica tem que pedir perdão ao ex-presidente Lula. Essa fala reverberou negativamente na maioria dos segmentos evangélicos. Afinal de contas, a maior parte dos indivíduos que professam a fé cristã evangélica em nosso país se identifica com as pautas do conservadorismo.
Apesar disso, mais do que o incômodo de uma repercussão negativa, o episódio em questão revela os sintomas de uma enfermidade crônica: a hierarquização de um sistema de governo lateralizado. Ou seja, a corrupção do congregacionalismo batista; a qual tem se manifestado por meio da formação de castas invisíveis na estrutura denominacional. A primeira delas é casta dos políticos. Formada em sua maioria por liberais, essa classe procura se perpetuar no poder, a fim de dar à denominação o rumo que considera mais adequado à sua linha teológica. Para tanto, se utilizam da popularidade e da influência da casta dos intelectuais; teólogos com vasta titulação acadêmica e adeptos do liberalismo teológico, aos quais a classe política atribui autoridade e infalibilidade, defendendo-os mesmo quando seus posicionamentos são claramente heréticos.
Por conseguinte, esse sistema piramidal se mantém com base na blindagem mútua das castas que se consideram superiores. As classes inferiores, por outro lado, integram a casta dos comuns. Ou seja, aqueles que dizem amém a tudo o que vem das castas superiores, seja bom ou ruim. Esses costumam considerar praticamente normativo o que os políticos e os intelectuais dizem, sem questionamento algum. Sabendo disso, quando um intelectual fala uma asneira e os comuns percebem, os políticos entram em cena impondo suas narrativas a fim de promover a inquestionabilidade de quem disse o que não devia. Por causa da autoridade e do prestígio dos políticos, nenhum dos comuns ousa confrontar seus argumentos, ainda que sejam frágeis e sem fundamento.
Nesse cenário caótico, há ainda os indivíduos considerados sem casta. Eles são reconhecidos dessa forma porque ousam questionar e confrontar as castas superiores. Por essa razão, os políticos e os intelectuais procuram constantemente caricaturizá-los como homens raivosos, desprovidos de formação acadêmica e cheios de inveja. Dessa forma, eles conseguem calar as únicas vozes contrárias. E assim, os políticos se perpetuam no poder, os intelectuais continuam destilando suas heresias e os comuns vão sendo conduzidos pelos ventos de doutrina. Isto é, nada muda.
Lamentavelmente, penso que, no caso do pastor que fez a infeliz declaração, as engrenagens funcionarão exatamente desse jeito. Os que denunciam o erro serão crucificados e os que o promovem serão absolvidos. Isso lembra a decisão do povo diante da oferta de Pilatos de soltar um preso por ocasião da Páscoa. As castas superiores guiaram os comuns para decidirem o que eles queriam. Sinceramente, isso parece mais aristocracia que congregacionalismo. Mas, infelizmente, é assim que temos caminhado.
Deus tenha misericórdia de nós.
Pr. Cremilson Meirelles