Cuidado: Querem desconstruir a sua fé – uma reflexão sobre o desconstrucionismo

1966

INTRODUÇÃO

“Tende cuidado para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo e não segundo Cristo” (Colossenses 2.8)

 Dentre as ferramentas contemporâneas empregadas para enfraquecer os alicerces da fé cristã, o desconstrucionismo é, provavelmente, a mais sutil e a menos mencionada. Contudo, descontrucionismo, relativismo, liberalismo e marxismo cultural são parentes muito próximos. Algo que todos compartilham, por exemplo, é a incompatibilidade com a fé cristã. Afinal, todas essas correntes tem por propósito substituir a verdade bíblica como lente interpretativa da realidade. Porém, sua relação só pode ser percebida claramente quando as observamos mais atentamente. Pensando assim, nesse texto, proponho-me a expor brevemente o desconstrucionismo, suas ferramentas e destacar os problemas de sua aplicação na interpretação do texto bíblico. E, embora o termo seja desconhecido pela maioria dos evangélicos, à medida que suas peculiaridades forem sendo apresentadas, você perceberá que se trata de um pensamento mais presente na igreja do que se imagina.

 1 – AFINAL, O QUE É DESCONSTRUCIONISMO?

Desconstrucionismo é um movimento intelectual, característico da pós-modernidade, que a partir da negação da existência de verdades absolutas desenvolve uma hermenêutica relativista. De sorte que, na ótica desconstrucionista, não há uma única interpretação verdadeira para a realidade, mas muitas; sendo cada uma delas igualmente válida. Esse pressuposto é aplicado principalmente na interpretação textual. De maneira que, para o desconstrucionista, o sentido de um texto depende da perspectiva de quem o analisa. Por conseguinte, a intenção do autor se torna irrelevante para sua interpretação. Dessa forma, “o conceito de verdade absoluta é visto como algo bastante nocivo, pois toda pretensão à verdade é considerada como arrogante, tirânica e obscurantista” [1].

Logo, toda noção de verdade que se apresente como única torna-se alvo da desconstrução perpetrada pelos desconstrucionistas; o que, na prática, se daria por meio do apontamento de contradições e da exposição de elementos que, no entender deles, visam fazer a manutenção do status quo[2] opressor. Isto é, procuram nos discursos e nos textos indícios de racismo, machismo, homofobia e opressão econômica, a fim de fragilizá-los e demonstrar que suas ideias não se sustentam.

Todavia, cada grupo usa essa desconstrução para promoção de seus interesses. As feministas, por exemplo, desconstroem os textos e discursos que consideram patriarcais para legitimar seus pressupostos; os marxistas fazem o mesmo com narrativas que entendem como opressoras.

Nenhum aspecto da existência escapa dos desconstrucionistas: princípios, valores, história, ciência, fé. Tudo pode ser desconstruído. Em suma, é mais um artifício satânico. Ele é o grande desconstrutor da verdade. Desde o Éden sugere que Deus é opressor. Disse que a ordem divina proibia a alimentação do primeiro casal (Gn 3.1) e que, na verdade, era produto do desejo de mantê-los numa condição inferior (Gn 3.2-5). Com essa argumentação, relativizou a verdade e incentivou a autonomia e autossuficiência humana para interpretar o discurso divino. Ou seja, descartou o autor (Deus) e absolutizou o intérprete, propondo uma nova interpretação. Exatamente o que os desconstrucionistas fazem.

2 – ORIGEM DO DESCONTRUCIONISMO

Influenciados por Friedrich Nietzsche (1844-1900), filósofo alemão que negava a existência de valores absolutos e proclamava o desprezo às instituições, Michel Foucault (1926-1984) e Jacques Derrida (1930-2004) desenvolveram a filosofia desconstrucionista.

Todavia, embora Foucault tenha contribuído bastante para o desconstrucionismo, uma vez que defendia que as verdades absolutas são na realidade construções que visam favorecer quem está no poder, o grande ícone desse sistema, considerado inclusive como seu fundador, foi Jacques Derrida. 

3 – PROBLEMAS DO DESCONSTRUCIONISMO

a) Inaplicabilidade

Conquanto alguns considerem o desconstrucionismo uma ferramenta eficaz, na prática sua eficácia é eliminada por uma contradição essencial. Senão vejamos: se, de fato, não há sentido fixo em nada, e toda verdade deve ser desconstruída, essa desconstrução deve ser aplicada também ao desconstrucionismo.

b) Exclusão de Deus

A irrelevância da identidade e das intenções do autor para a interpretação fundamentam a cosmovisão desconstrucionista. Em decorrência disso, os desconstrucionistas procuram interpretar a realidade a partir da ausência de Deus. Isto é, o Criador é excluído do discurso sobre a Criação (Sl 53.1), assim como o autor é desconsiderado na interpretação do texto.

c) Fragilização do princípio de autoridade

A eliminação do autor enfraquece a crença na autoridade. Afinal de contas, já que o significado não depende de quem produz, a autoridade é transferida para o intérprete, o qual se torna soberano. Assim, a Bíblia deixa de ser regra de fé e prática. Pois, se não há um significado único e absoluto intencionado pelo autor, não há normas ou padrões, seja na família ou na igreja. A única autoridade é o intérprete.

Esse pensamento contraria frontalmente as Escrituras Sagradas, uma vez que o texto bíblico assevera que é possível entendê-lo e, até mesmo, torcê-lo (2Pe 3.14-16). Mostrando que há um sentido correto e único que independe da perspectiva do intérprete.

d) Impedimento de raciocínios verdadeiros

Para a desconstrução pensar é sempre repensar. Nada pode ser definitivo. Logo, a verdade nunca pode ser alcançada. Nenhum questionamento pode ser plenamente respondido. A pergunta de Pilatos (Jo 18.38) e a famosa declaração de Jesus (Jo 14.6), por exemplo, não fazem sentido nesse contexto. Não há padrões. Só perguntas sem resposta. Como, então, um raciocínio pode ser verdadeiro? Como é possível encontrar lógica na existência? Já que não existem critérios ou normas, como alguém pode fazer qualquer tipo de escolha? Isso transforma os homens em animais e o mundo numa selva, onde o ego reina soberano, mas alienado.

4 – APLICAÇÃO DO DESCONSTRUCIONISMO À INTERPRETAÇÃO BÍBLICA

Esse é um problema grave e mais comum do que se pensa. Há vários pastores na atualidade que, a fim de justificar ideias e condutas contrárias ao ensino bíblico, defendem a impossibilidade de determinar um sentido único e verdadeiro de qualquer trecho das Escrituras. Ou seja, conforme esse raciocínio, não dá para saber o que a Bíblia diz.

Esses líderes, com muita frequência, buscam fundamentar sua argumentação usando os momentos históricos em que a Bíblia foi usada para legitimar atrocidades, tais como matanças, escravidão, ditaduras, etc. Porquanto, entendem que quem afirma possuir a interpretação correta, na verdade, visa defender interesses particulares, que geralmente objetivam a opressão. Uma interpretação correta e única, portanto, só seria possível se o próprio Deus “descesse do céu” e a informasse aos homens. Mas, como isso não acontece, toda interpretação é válida.

Essa argumentação é uma clara aplicação da filosofia desconstrucionista à interpretação bíblica. Por essa razão, é naturalmente contraditória. Senão vejamos:

a) Seus pressupostos eliminam a essência da fé cristã

Já que não há verdades absolutas e nem uma única interpretação verdadeira, como as doutrinas básicas do cristianismo podem ser sustentadas? Não dá, por exemplo, para crer na Trindade. Consequentemente, não dá pra crer na divindade de Cristo, e muito menos na existência de um criador. É impossível, inclusive, saber o que é certo ou errado. Sendo assim, não existe pecado!

b) Seus defensores procuram contradições bíblicas

Para desconstruir as verdades bíblicas e legitimar todo tipo de coisa, os teólogos desconstrucionistas se empenham na busca por aparentes contradições nas Escrituras. Pois, para eles, essas contradições revelam a instabilidade do texto e confirmam sua tese de que não há um sentido único, mas vários.

c) Seu resultado é uma religião politicamente correta

O produto dessa união entre desconstrucionismo e teologia é uma fé que não “ofende” a sensibilidade alheia. Até porque, todas as interpretações são bem-vindas. Pregar ou defender verdades absolutas seria o mesmo que agredir a consciência do outro. Dessa maneira, o papel do cristão seria o de se adaptar ao imenso oceano interpretativo que caracteriza a pós-modernidade, sem, no entanto, modificá-lo. Ou seja, abandonar a essência da fé cristã.

CONCLUSÃO

O desconstrucionismo é inaplicável e anticristão. Seus pressupostos destroem os fundamentos da nossa fé. Um pastor defendendo esse tipo de coisa é o mesmo que um judeu abraçar o nazismo. Não há compatibilidade entre a fé cristã e essa filosofia satânica. “Porque que sociedade tem a justiça com a injustiça? E que comunhão tem a luz com as trevas?” (2Co 6.14)

Onde quer que você identifique esse pensamento, confronte-o. Porque se trata de uma armadilha do diabo para eliminar a evangelização e destruir a fé. E como diz a Escritura, é necessário “batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos” (Jd 1.3).

Pr. Cremilson Meirelles
Colaborador deste Portal


[1] NICODEMUS, Augustus. A Bíblia e seus intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2013.

[2] Expressão latina que significa “estado atual”.

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